Ouro Preto: O amor inconfidente

30 de novembro de 2018
Irineu Ramos

Em Marília de Dirceu, uma das mais conhecidas histórias de amor da literatura, o autor Tomás Antônio Gonzaga toca os leitores com sensibilidade semelhante às obras de Shakespeare. Escrita no século XVIII, publicada em Lisboa e ambientada na então Vila Rica, atual Ouro Preto, o pastor Dirceu, noivo da pastora Marília, exalta a beleza física da amada e destaca suas próprias qualidades: inteligência e riqueza. 

Contada em liras, a história verídica, retrata a paixão de Gonzaga, no pseudônimo Dirceu então com 40 anos de idade, por Maria Dorotéia Joaquina Seixas Brandão (Marília, com apenas 17 anos) rica herdeira local. Integrante do grupo dos inconfidentes mineiros que luta contra a cobrança do ‘quinto’ pela Coroa portuguesa é bastante perseguido.

O autor, então, exila-se em Moçambique onde se casa com Juliana de Souza, filha de um rico traficante de escravos. Mesmo casado continua a escrever versos para a musa brasileira. Sem notícias, Maria Dorotéia permanece solteira, vagando pelas ruas da cidade a espera do amado até morrer aos 90 anos de idade. Ainda estão lá as casas onde viveram.

Ruelas com calçamento em pedra são a característica da cidade que mantém preservados os edifícios do período colonial brasileiro

            Ouro Preto é assim. Terra de paixões arrebatadoras, ouro, pedras preciosas, cobiça, tradição e história. É impossível falar sobre a memória do Brasil sem citar a cidade. Visitá-la é retornar no tempo e entrar em contato com a pujança de uma época retratada em edifícios coloniais bem preservados, museus equipados e com um povo acolhedor que, além de receber bem o visitante, tem sempre um causo para contar envolvendo mistério, traição, ouro escondido, escravos e fantasmas. Tudo regado a famosa cachacinha artesanal e a boa comida mineira.

Ouro Preto carrega o título de primeira cidade brasileira declarada, em 1980, Patrimônio Histórico e Cultural da Humanidade, pela Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura – Unesco. O turista fica surpreendido ao descobrir que a cidade oferece muito mais que arquitetura barroca, importância histórica e turismo religioso disponibilizado em 12 igrejas e 17 capelas. Há um rico e variado ecossistema com cachoeiras, trilhas seculares, uma gigantesca mata nativa além de uma série de minas de extração de ouro e pedras preciosas abertas à visitação. E é no carnaval que a cidade é totalmente invadida por milhares de jovens que comemoram a festa organizada pelos moradores das repúblicas estudantis em suas ladeiras.

Tanto a casa de Maria Dorotéa Joaquina Seixas Brandão, a Marília do conto citado na abertura do texto quanto a de Tomás Antônio Gonzaga, o Dirceu, podem ser visitadas. A dela funciona hoje uma escola pública e, onde ele morou entre 1782 e 1788, no centro, está a Secretaria de Turismo, Indústria e Comércio do Município.

 

Denominado Marília de Dirceu, o chafariz instalado em 1758 é uma obra tipicamente barroca reproduz figuras humanas está bem próximo da casa onde viveu Dorotéia. O local abriga uma escola pública atualmente.

Marília de Dirceu dá nome a um largo, um chafariz e uma ponte de acesso à antiga residência. Atravessando a ponte chega-se ao largo onde está o chafariz instalado em 1758. A obra tipicamente barroca apresenta vários elementos que remetem ao estilo como conchas e folhas de acanto. O monumento é considerado um dos mais importantes e bem compostos chafarizes do Brasil. 

Vista panorâmica da praça Tiradentes. Ao fundo, o Museu da Inconfidência, criado em 1938 num edifício construído em 1785. Abriga um dos mais importantes acervos de arte barroca que vai de oratórios e esculturas até presépios e retábulos. Além de inúmeras peças feitas por Aleijadinho.

Conhecida até então como Vila Rica, somente em 1823, após a Independência do Brasil, é que D. Pedro I a transformou em capital da província das Minas Gerais, quando passou a ser chamada de Ouro Preto. Somente em 1897 a capital passou a ser Belo Horizonte.

 

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