Primeira viagem aos EUA: oeste americano

10 de julho de 2018
LPM

Ao contrário do desejo de grande parte dos brasileiros de visitar os EUA com o sonho de conhecer o mundo encantado de Walt Disney e embarcar na irresistível maratona de compras de Orlando, minha primeira experiência no país surpreendentemente me levou a uma viagem mergulhada na história dos índios americanos. Meu visto foi solicitado para embarcar diretamente ao Oeste Americano, mais precisamente para o estado do Arizona! Foi a primeira impressão que tive dos Estados Unidos e a mais incrível, que quebrou muitos paradigmas e superou as minhas expectativas.

Eu ainda não havia conhecido todos os países que hoje, com muita felicidade e gratidão, tenho assinalados na minha bucket list, mas sempre soube que o meu propósito e o que me atrai em viagens são as atrações culturais, a arquitetura e as belas paisagens/natureza. Mas nunca ninguém me falou, e eu nunca havia me interessado em pesquisar um pouco mais a fundo, que a terra do Tio Sam é muito diversificada e oferece muito mais do que parques de diversões, outlets gigantescos e almejadas redes de fast food.

Tudo é questão de perspectiva

Todos os meus amigos sempre dividiam suas histórias de viagens aos Estados Unidos, focando nas taxas locais mais baixas para compras e sobre nas maravilhas eletrônicas que traziam na bagagem, assim como nos jogos de basquetes e shows da Broadway, etc. Eu não me recordo de ninguém empolgado me sugerindo visitar o Museu de História Natural ou Museu Nacional do Índio Americano de Washington, ou o Centro do Patrimônio Cultural Cherokee nos pés das Montanhas Ozark, em Oklahoma, dedicado a preservar a cultura e os objetos da tribo Cherokee; ou sobre as marcas da história registradas na arquitetura, ou outro assunto que me faria brilhar os olhos para planejar um itinerário aos Estados Unidos.

Hoje eu compreendo que cada viajante possui um olhar único sobre cada destino e suas experiências, bem como interesses diferentes de acordo com cada momento da sua vida. E isso é o mais belo de fazer parte do mundo dos apaixonados por viagens. Cada um constrói sua própria história e registra suas memórias dos lugares de uma maneira única!

Sempre amei conversar sobre viagens nos encontros entre amigos, e sobre minha vontade de conhecer o mundo como objetivo de vida. Passava horas dividindo minha paixão por viagens e tentando convencer a todos que o melhor investimento que uma pessoa pode fazer em si mesmo é em viagem de conhecimento. Daquelas que te transformam de dentro para fora e te fazem questionar o que realmente é a felicidade, sabe?! Mas sempre questionava se encontraria nos Estados Unidos esse tipo de viagem. Será que estava sendo injusta ou era realmente falta de conhecimento? Acredito que as duas coisas!

Minha experiência no oste americano

Foi em 2013, em uma viagem a trabalho que me motivou a ir para o estado do Arizona. Fiquei muito animada, pois ao pesquisar sobre os atrativos turísticos do destino encontrei muitos destaques para a cultura do velho oeste, a rota 66 e o famoso Grand Canyon. E “plin”… Uma grata surpresa e uma ansiedade enorme em saber que eu iria para um estado americano ainda pouco desbravado pelos brasileiros e com paisagens deslumbrantes e únicas.

Mesmo sendo fronteira com a Califórnia e com Nevada, eram poucos brasileiros que realmente exploravam o destino. Apesar de o Grand Canyon estar localizado no estado do Arizona, grande parte dos brasileiros ainda associam a visita ao mesmo em suas viagens à Las Vegas a partir de um day tour. Poucos sabem que os cânions, localizados na fronteira com o estado de Nevada, e que são visitados por muitos turistas a partir de Las Vegas, não fazem parte do Parque Nacional do Grand Canyon e que, ainda, é território dos índios nativos Hualapai. É nessa parte que está localizada a famosa passarela de vidro Skywalk.

Índios do oeste americano

E foi exatamente a história dos índios americanos que me chamou a atenção na minha primeira visita ao Arizona. Foi quando cheguei à capital, Phoenix, que fiz uma visita guiada ao Heard Museum e conheci a história e atual realidade das tribos indígenas americanas. Nem ao menos imaginava a linda história e tragédia das tribos indígenas durante a expansão ao Oeste Americano. Para quem ama museus, história e cultura como eu, dificilmente irá encontrar uma coleção tão expressiva e impressionante quanto a desse museu. Com coleções completas e história detalhada das diferentes tribos do país.

Foi a partir dessa visita que eu soube que no território do Arizona, e em diversos estados americanos, existe uma fascinante herança indígena das tribos Hopis, Navajos, Apaches, Hualapais, entre outras. As 22 tribos que existem até os dias atuais ocupam mais de um quarto da área do estado e fazem grandes contribuições para a vida espiritual, cultural e econômica local. O estado do Arizona e todo o oeste americano possui uma cultura muito influenciada pela herança indígena.

Mas, na minha opinião, essa herança cultural indígena ultrapassa os patrimônios que tornam a história tangível como joias, vestimentas, artesanatos e utensílios. É através da visita, contato e vivência local juntamente às tribos, em suas casas e territórios oficiais – dentro dos parques e reservas nacionais – que a experiência e a real compreensão das culturas e povos se concretizam. Que privilégio poder ouvir suas histórias, realidades, conquistas e diferenças. São diversos parques com paisagens de tirar o fôlego que abrigam diferentes tribos.

Eu tive a oportunidade de visitar algumas das mais incríveis áreas indígenas do Arizona, como o Parque Nacional do Grand Canyon, o Monumento Nacional Canyon de Chelly e o Parque da Tribo Navajo Monument Valley. Esse último, na fronteira com o estado de Utah, é uma das maiores áreas indígenas do país e uma das paisagens mais fotografadas dos Estados Unidos – palco para a gravação de muitos filmes de Hollywood. Foi no Monument Valley que tive uma das experiências mais incríveis e transformadoras da minha vida. Fiquei hospedada no único hotel localizado dentro do parque, The View Hotel , que possui vista para paisagens icônicas. Um hotel simples, mas com uma razão única de ser: desenvolver a economia local através do turismo para a comunidade local dos índios Navajos.

Uma memória para toda vida

Durante minha estada no parque, fizemos um passeio em um jipe 4×4 dentro das paisagens e gigantescas rochas vermelhas. A guia local, uma garota da mesma idade que eu, filha de índios Navajos, e que usava tênis All Star, orgulhosamente nos mostrava os principais pontos onde foram gravados filmes conhecidos como Indiana Jones. Ela estava feliz em nos mostrar como o mundo de Hollywood era fascinado em promover as paisagens áridas e pedras avermelhadas do seu lar nos filmes de faroeste. Ela queria mostrar que ela também vivia no mesmo mundo que nós.

Mas foi em uma parada despretensiosa e não planejada, para que pudéssemos tomar água e descansar em uma caverna de pedras, que ela compartilhou conosco sua real e linda personalidade, sua herança, DNA e herança cultural. Ela nos contou que era nessa caverna que sua família parava para descansar entre os áridos quilômetros que percorriam no meio do parque. Era ali que sua avó a ensinava cantar uma música indígena muito significativa para sua família e que falava sobre o respeito entre os povos do mundo. A garota não imaginava que ao cantar tal música, estaria nos proporcionando a mais valiosa experiência que aquele grupo de turistas poderia ter. Foi de arrepiar, um momento único e de uma emoção inexplicável. Uma experiência para a vida toda. Naquela época, o stories do Instagram não era famoso, acho até que nem existia. O único registro foi eternizado na memória! Com certeza, a melhor experiência que eu poderia ter durante minha primeira visita aos Estados Unidos.

A importância dos parques no oeste americano

Foi naquele momento que pude entender que muito mais que gerar recursos financeiros, abrir um parque nacional para visitação, gerenciado por uma comunidade indígena que nele reside pode, de fato, ser uma atividade transformadora e positiva para as comunidades indígenas e fator predominante para a preservação do patrimônio ambiental. Mas a responsabilidade do visitante é ainda maior, não só referente ao impacto e responsabilidade ambiental, mas também na valorização e proteção do patrimônio social e cultural – Lugares como esse que pertencem a todos nós! Nosso papel e nossa maneira de se relacionar com essa comunidade, pode sim impactar positivamente ou negativamente.

Tive a grata oportunidade de visitar o Arizona quatro vezes mais, e vivenciar diferentes experiências fora das rotas turísticas convencionais do oeste americano como o hiking no Horseshoe Bend, expedição fotográfica no Antelope Canyon, yoga na espiritual Sedona, cavalgada no pôr do sol do Deserto de Sonora (na fronteira com o México). Também visitei outros estados americanos, destinos e cidades encantadoras. Cada lugar com sua característica. Quanta paisagem linda esse país oferece, diversidade cultural e quanta experiência inesquecível! Esse é os Estados Unidos que eu almejava conhecer.

Hoje, sabendo de sua história, da sua diversidade de povos e paisagens, da importância da Disneylandia para a cultura americana… Ah, hoje sim eu tenho interesse em conhecer esse mundo de sonhos encantados!

Por Mara Pessoas*

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