A trip e o Tao

28 de dezembro de 2019
Felipe Moreno

Egrégora de mendigos: parte 5

Pegamos o Tao Te King, livro magno do taoísmo, escrito por Lao Tsé, há nem sei quantos séculos antes de Cristo, para ler durante a viagem. Caiu nas nossas mãos como um presente do universo – um sinal do Tao. 

Obstinados pela filosofia chinesa milenar, já estamos, na verdade, dissecando duas traduções diferentes dessa obra que, para muitos, é sagrada (há quem a considere tão importante quanto a Bíblia, e eu concordo). 

Crédito: Felipe Moreno

Leitura sagrada somada à nossa rotina que, em alguns dias, é árdua e intensa: comemos pouco, bebemos pouco e andamos muito. Caminhadas com mochilas pesadas nas costas que às vezes chegam a 8km, ora embaixo de sol forte, ora atravessando o frio cortante. 

Até que surgiu mais uma piada: “Mais um pouquinho neste ritmo e a gente ilumina de vez”. Como que querendo dizer: toda essa nossa moderada penitência e ascetismo nos levará à sabedoria total. 

Nosso repertório de piadas tem predileção pelos temas universais e místicos. Pois, no fundo, a gente crê que nem a possível existência de um sagrado deve ser levada muito a sério. E a iluminação, inclusive, caso seja um fenômeno real, como nos descreveram algumas figuras históricas, também não é algo que se deva almejar. 

Lições do taoísmo e também do budismo: se está desejando a iluminação, você já está dois passos mais distante dela; quanto mais se fala no universo, mais longe você fica de sua sabedoria. 

De novo: a iluminação, ou a sabedoria, se preferir, não é algo a ser buscado, desejado. Deve-se apenas viver. E contemplar. E rir. E, por fim, com a maior das espontaneidades, sensibilidade e intuição profunda, deixar-se ir. 

Crédito: Felipe Moreno

O oceano é um retrato perfeito de como a espécie humana deve viver. Perdoe o exagero, mas, para mim, é claro: todo mar é uma manifestação metafísica. Espécie de metáfora da natureza que quer nos transmitir uma profunda sabedoria, um exemplo de como se deve viver e de como a vida é. 

Mais que escutado e observado, a atividade das ondas – seu fluxo conectado com o todo, seu vai e vem que nada deseja, mas mesmo assim se move e age; o repertório das águas que não começa nem finda, mas parece que apenas existe numa eterna dança – é algo a ser imitado.

Cabo Polonio, Uruguai – 08 de maio de 2018


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